quinta-feira, 29 de novembro de 2007

Sobre transexuais psicóticas


Terminei outro livro hoje. Um fininho, "Problemáticas da identidade sexual", de José Carlos Garcia (é de uma coleção chamada Clínica Psicanalítica, lançada pela editora Casa do Psicólogo). Coisa bem direcionada ao público interno, profissionais da área. O que tornou a leitura mais interessante, pois é a formação que os caras estão tendo. O livro aborda casos e reflexões clínicas sobre a homossexualidade e a transexualidade, do ponto de vista freudiano.

O que achei? Uma bosta.

Não sei se foi culpa do livro ou do autor especificamente - acho que minha cismo é mais com a psicanálise em si. Uma generalização sem tamanho, contraditória até: na apresentação do livro, em uma passagem muito feliz (das duas únicas passagens felizes do livro), o organizador da coleção, Flávio Carvalho Ferraz, diz que "Não se pode nem mesmo falar da heterossexualidade ou da homossexualidade, mas de identidades singulares de sujeitos singulares." Fantástico, né? O sentido é: cada um constrói sua sexualidade do seu jeito particular e, portanto, falar de uma sexualidade é falar daquela sexualidade daquele indivíduo. E só. Lembra o espectro de Kinsey, de 0 a 6, como se fosse um continuum e não algo discreto (0, 1, 2, 3, 4, 5, 6 apenas) etc e tal.

Mas aí, no livro, o autor pega uns três casos de homossexualidade tratados por Freud, um caso clínico pessoal e, com esses quatro exemplos, pretende definir a teoria geral da homossexualidade... O memso com as trans: ele pega um caso de Freud (de um cara com delírios paranóicos de estar virando mulher e sendo inseminado(a) por Deus (!)) e três casos clínicos pra concluir que todas as transexuais são psicóticas e as travestis, pervertidas. Just like that.

Olha um exemplo de argumentação: Nesses três exemplos as mães tinham cabelos curtos e isso mostra como elas tinham uma sexualidade indefinida e passaram isso a seus filhos. Ah, e os pais eram ausentes. Pelamor!!

Não que ele tenha sido homofóbico ou algo assim. Ele até tratou o tema com bastante respeito e, sobre o paciente gay dele, chegou a umas conclusões bem satisfatórias (por exemplo, que o problema não era o paciente ser gay, mas em não se aceitar totalmente como tal e reprimir vivências que deveria estar tendo. Legal!). Mas quando chegou nas trans ele se perdeu.

Tá, o tema é espinhoso. Mas eu não mandei ele escolher falar sobre isso, carácoles!

Me parece que ele seguiu o que manda o cânone psicanalítico - o que enterraria a psicanálise, pra mim. Sorte que eu li recentemente outro livro sobre o tema (sobre psicanálise e homossexualidade) que deu de 10 nesse. Vou ter de reler e postar aqui.

Já comecei outro, "O estado e a revolução", de Lênin (edição da Hucitec, apresentada por Florestan Fernandes). Pra dialogar com o Bobbio. Já tive orgasmos só na apresentação. Não sei por que não tinha lido ainda.

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